DIREITO INTERTEMPORAL EM FACE DO NOVO CPC
Introdução
Na data de 16 de março de 2015 a Presidente da República sancionou a Lei nº. 13.105, a qual, após vários anos de estudos, deu ensejo ao tão esperado Código de Processo Civil. Referida lei entrará em vigor um ano após sua promulgação ( ou seja, dia 18/03/16 – LC/98, art. 8º, §§ 1º e 2º).
Essa nova norma representou um anseio social (fonte material), dando ensejo à sua promulgação. Uma nova lei presume-se, certa forma, melhor que a anterior.
Diante disso, urge verificar os limites temporais de aplicabilidade dessa lei nova aos processos pendentes e se seria, deveras, acomodada a esses. É dizer, melhor compreender o limite temporal de seu possível emprego; os atos processuais ainda plausíveis de serem atingidos pela novel norma, etc.
Com efeito, mister que balizemos o contérmino entre os atos processuais atingidos pela lei nova e aqueles ressalvados em face da lei pretérita. Há, claro, embaraçoso conflito temporal de leis processuais, o qual merece um desenlace apropriado.
Ressaltamos, ademais, que estas apertadas linhas se prendem à área do direito nomeada direito processual intertemporal. É por essa que encontraremos, ao nosso sentir, uma resposta adequada às diversas hipóteses de conflitos de regras, cingidas, como ditas, à diretriz processual.
De outro bordo, é preciso que façamos, e assim cheguemos ao nosso desiderato a contento, a diferença de ato processual, fase processual, fato processual e outros aspectos de dimensão processualista, pertinentes à hipótese em destaque.
Serão vistos, então, nas linhas que se seguem.
Direito processual adquirido.
Subsistindo duas leis – uma anterior e uma posterior – que, teoricamente, pudessem regrar determinada situação, estaríamos, então, nesse caso, diante de uma colisão de normas no tempo. Nesse passo, tormentoso se apurar qual delas acomodar-se-ia a certo evento.
Tocantemente às leis processuais não há diferença. Existindo conflito — no tempo — entre essas, a questão será delimitada, também, pelos princípios gerais da não-retroatividade e da pronta aplicação da lei nova.
Dessa maneira, a lei processual, não se distanciando das demais leis, deve respeitar o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Procura-se preservar as situações jurídicas consumadas sob o império da lei antiga. A lei, dessarte, estabelece e regula condutas jurídicas para o futuro. Por outro ângulo, as regras do direito processual têm aplicação imediata, inclusive incidindo nos feitos pendentes (CPC/2015, art. 14 c/c art. 1046, caput). Não se aplica, entrementes, aos processos findos, regrando, claro, aqueles que surgirem após o advento da norma.
Aparenta-se que a aplicação da lei nova aos processos inacabados, resultaria em um tresandar da novel regra. Isso é inverídico, como veremos a seguir.
Ocupando-se de direito processual intertemporal, a doutrina adota postura próxima de uniforme, quando realça que essa se divide em três sistemas que poderiam ser empregados:
a) o processo é indivisível, tornando-se uma unidade, um só corpo, um conjunto de atos inseparáveis uns dos demais. Desse modo, face à unidade processual, aquele somente poderia ser regulado por uma única lei. Incabível, portanto, para essa hipótese, um concurso de regras aplicáveis. Portanto, diante do princípio da irretroatividade das leis, somente a lei velha poderia ser adotada aos processos em trâmite;
b) em outra orientação – um segundo sistema – a lei nova atingiria não mais que limitadas fases processuais, subsequentes a sua entrada em vigor. Aqui se leva em conta as várias fases processuais do procedimento, autonomamente consideradas, como a postulatória, probatória, decisória e recursal. Assim, a fase do processo já iniciada seria disciplinada pela lei anterior, sendo certo que as posteriores devem obediência à lei nova;
c) de resto, há um terceiro sistema que enfatiza o ato processual, visto separadamente dentro do contexto de um processo. A lei nova respeitará os efeitos jurídicos do ato processual já consumado (CPC/2015, art. 200). Essa é a tese mais assentida pela doutrina e, mais, o sistema adotado pelo Novo Código de Processo Civil ( 14 c/c 1.046, caput).
Acrescentamos, em corroboração ao antes dito, o magistério de Guilherme Rizzo Amaral, verbis:
“Como já referimos noutra oportunidade, a ideia de ato consumado sob o império da lei vigente na época em que se consumou é muito mais precisa, na medida em que nos permite afastar a aplicação da lei nova ( i ) para invalidarmos ato validamente praticado na vigência da lei antiga (na hipótese de a lei nova trazer-lhe novos pressupostos de validade, antes inexistentes e ausentes na prática do ato em questão) e ( ii ) para convalidarmos ato consumado sem algum dos requisitos exigidos pela lei vigente á época da consumação.
Se a proteção da irretroatividade da lei processual nova fosse apenas para não atingir atos validamente praticados pela lei antiga, então o caminho estaria aberto para atingirmos aqueles atos praticados sem as exigências legais previstas na lei antiga, validando-os com a entrada em vigor da lei nova, caso esta retirasse as exigências que antes impediam o reconhecimento da validade do ato. “ (in, Comentários às alterações do novo CPC. São Paulo: RT, 2015, p. 75-76)
( itálico do texto original)
Com o mesmo sentir são as lições de Luiz Guilherme Marinoni, verbo ad verbum:
“A legislação processual civil superveniente impacta de maneira imediata os processos pendentes, desde que respeitados eventuais direitos adquiridos processuais e os atos processuais perfeitos. Há efeito retroativo quando a lei nova é aplicada a situações jurídicas já consolidadas. O efeito retroativo é vedado pelo direito constitucional brasileiro (arts. 5º, XXXVI, CF e 14, CPC)” (in, Novo Código de Processo Civil comentado. — São Paulo: RT, 2015, p. 113)
Considerações finais
Diante do exposto, somos da inteira opinião que o novo CPC trará reflexos processuais quanto aos feitos inacabados, não obstante tenha que se preservar o princípio da não-retrovatividade da lei.
A nova legislação processual deverá concorrer unicamente aos atos não rematados dentro do feito.
Exelente , vislumbra a importância da preservação da Lei pretérita, e coloca – se a disposição de continuidade da Lei nova com seus respectivos meios processuais, mantendo -se intacta a regra anterior e inovando com a nova para os casos específicos.