O ADVOGADO E A TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE
Por Alberto Bezerra
Não raro nos deparamos com casos em que colegas negligenciam certo proceder no labor advocatício. Com isso, ordinariamente há um reflexo direto na pretensão de direitos correspondentes ao seu cliente. São os casos, por exemplo, de perda de prazo recursal, deixar a pretensão do cliente ser atingida pela prescrição, interpor recurso errado ou mesmo ingressar com ação descabida à hipótese.
É inquestionável que, nessas situações, a postura do advogado pode concorrer para a clássica Teoria da perda de uma chance.
Todavia, para se caracterizar, de fato, a teoria da perda de uma chance, algumas particularidades devem ocorrer. Acima de tudo há de existir, nitidamente, uma negligência do profissional do Direito. Mais ainda, identificar um evento não só era possível de acontecer, mas sim muito provável. Um exemplo seria um provável recebimento de uma verba rescisória trabalhista, quando evidente que o tema versado já se encontrava sumulado no TST.
Suponhamos, então, ainda com suporte no quadro fático acima exemplificado, se os direitos do cliente do advogado forem rechaçados unicamente pela prescrição. E mais, de tal forma que sequer fora possível ser oportunizado o debate de mérito da pretensão, nesse caso há possibilidades fortes que tenha havido negligência do advogado. Aqui, aparenta que esse seria o único fator decisivo do não recebimento dos valores almejados por seu constituinte. Nesse passo, existindo notória culpa do advogado, emergirá, desse modo, a possibilidade da sua condenação a reparar os danos ocasionados.
Com referência ao tema, de todo oportuno gizar o magistério de Sérgio Savi, in verbis:
“Inúmeras são as situações na vida cotidiana em que, tendo em vista o ato ofensivo de uma pessoa, alguém se vê privado da oportunidade de obter uma determinada vantagem ou de evitar um prejuízo.
Os exemplos são vários e muito frequentes no dia a dia. Dentre os exemplos mais conhecidos pode-se citar o clássido do advogado que perde o prazo para interpor o recurso de apelação contra a sentença contrária aos interesses de seu constituinte.
Ninguém poderia afirmar, com certeza absoluta certeza, que, acaso interposto, o recurso seria provido. Contudo, diante do caso concreto, é possível analisar quais eram as reais chances de provimento do recurso, se a hipótese era de mera possibilidade ou de efetiva e séria probabilidade de reforma do julgado. “( SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. 3ª Ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 1)
A corroborar o pensamento acima, sublinhamos as lições de Flávio Tartuce, ipsis litteris:
“A perda de uma chance está caracterizada quando a pessoa vê frustrada uma expectativa, uma oportunidade futura, que, dentro da lógica do razoável, ocorreria se as coisas seguissem o seu curso normal. A partir dessa ideia, como expõem os autores citados, essa chance deve ser séria e real. “ (TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das obrigações e responsabilidade civil. 7ª Ed. São Paulo: Método, 2012, vol. 2, p. 419)
Necessário se faz mencionar o que aduz Sílvio de Salvo Venosa, ad litteram:
“Em muitas situações, ao ser concedida a indenização por lucros cessantes, os tribunais indenizam, ainda que em nosso país não se refira ordinariamente à expressão, à perda de oportunidade ou perda de chance, frequentemente citada na doutrina estrangeira: atleta profissional, por exemplo, que se torna incapacitado para o esporte por ato culposo, deve ser indenizado pelo que presumivelmente ganharia na continuidade da carreira. Chance é termo admitido em nosso idioma, embora possamos nos referir a esse instituto, muito explorados pelos juristas franceses, como perdade de oportunidade ou de expectativa. No exame dessa expectativa, a doutrina aconselha efetuar um balanço das perspectivas contras e a favor da situação do ofendido. Da conclusão resultará a proporção do ressarcimento. Trata-se então do prognóstico que se colocará na decisão. Na mesma senda do que temos afirmado, não se deve admitir a concessão de indenizações por prejuízos hipotéticos, vagos ou muito gerais. “ (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 12ª Ed. São Paulo: Atlas, 2012, vol. 4, p. 308)
Com efeito, é ancilar o entendimento jurisprudencial:
APELAÇÃO CÍVEL. MANDATO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS.
Réu contratado para patrocinar, em reclamação trabalhista, interesses de esposa e filho de empregado falecido. Demanda, porém, que nunca foi proposta, por negligência do advogado. Alegação de prescrição do direito de reclamar as verbas rescisórias. Ação de indenização por danos materiais e morais. Improcedência em relação ao filho. Prescrição que não corre contra menor absolutamente incapaz. Possibilidade de ajuizar a reclamação trabalhista, não obstante a inércia do requerido. Pedido parcialmente procedente em relação à esposa. Impossibilidade de lhe atribuir o benefício econômico que esperava auferir com a ação trabalhista. Dano meramente hipotético ou conjetural. Indenização que deve se limitar ao dano moral decorrente da perda de uma chance. Precedentes. Termo inicial da correção monetária e dos juros moratórios. Data do arbitramento. Sucumbência recíproca. Sentença reformada em parte. Recurso parcialmente provido. (TJSP; APL 9148756-17.2008.8.26.0000; Ac. 7311338; São Carlos; Terceira Câmara Extraordinária de Direito Privado; Rel. Des. Hélio Nogueira; Julg. 30/01/2014; DJESP 11/03/2014)
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PRESCRIÇÃO. Preliminar de mérito reiterada nas razões do apelo. Rejeição. Operado o substabelecimento do mandado sem reserva de poderes, excetuando o prévio e inequívoco conhecimento do cliente, não se evidencia ultimado o prazo de um triênio, relacionado a pretensão de reparação civil, se protocolizada a petição inicial em período ânuo circunscrito à data do correlato substabelecimento. Prescrição despronunciada. ATO ILÍCITO. Mandato. Ação reparatória por danos materiais e morais acionada por constituinte contra o mandatário judicial e o advogado substabelecido. Alegada negligência ao exercício do mandato. Sentença de parcial procedência jungida à condenação do mandatário. Confirmação. A frustrada oportunidade do demandado obter o patrocínio conveniente do litígio em que foi condenado, advinda do desleixo do mandatário em defende-lo, não caracteriza mera conjectura, mas perda da chance séria e provável em contar com a contribuição do advogado na postulação de decisão favorável ao constituinte, haja vista sujeitar-se o mandato judicial, supletivamente, à norma de direito material civil codificado, regramento que compele o mandatário a aplicar toda a sua diligência habitual na execução do mandato. Recurso desprovido. (TJSP; APL 0169857-60.2008.8.26.0100; Ac. 7374006; São Paulo; Vigésima Oitava Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Julio Vidal; Julg. 18/02/2014; DJESP 28/02/2014)
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ADVOGADO. DESÍDIA. NÃO AJUIZAMENTO DE RECLAMAÇÃO TRABALHISTA TEMPESTIVAMENTE. PRESCRIÇÃO. APLICAÇÃO DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. DANO MATERIAL E MORAL. CONFIGURAÇÃO.
1.A teoria da perda de uma chance foi originalmente desenvolvida para dar respostas às perplexidades derivadas da dificuldade de se indenizar a frustração de uma oportunidade de ganho, nas hipóteses em que há certeza quanto ao causador do dano e incerteza quanto à respectiva extensão. Nesta senda, verifica-se a plena adequação da aplicação da referida teoria aos casos de responsabilidade civil do advogado negligente, desde que a falha na prestação dos serviços contratados implique na frustração da oportunidade do contratante de almejar posição mais benéfica, a qual possivelmente seria alcançada se não houvesse a ocorrência do ilícito praticado. 2.A doutrina majoritária considera a indenização pela perda de uma chance como uma terceira modalidade de dano material, a meio caminho entre o dano emergente e os lucros cessantes. 3.Na espécie fática retratada nos autos. prescrição de direitos trabalhistas em razão da falha na prestação de serviços por advogados prepostos do Sindicato réu, que, possuindo os documentos necessários, não ajuizaram reclamação trabalhista de modo tempestivo -, o fator negligência se aglutina com a variável alta chance de sucesso a fim de emergir o dever de o demandado indenizar a oportunidade perdida. 4.In casu, além dos danos materiais oriundos da frustração de uma possibilidade real de ganho, ressoa cristalino que o descuido inescusável do demandado também ocasionou danos de ordem moral ao autor. De fato, os danos causados ao requerente transcenderam em muito ao mero dissabor ou aborrecimento, afetando diretamente sua paz de espírito e sua tranquilidade psíquica. 5.Apelação do réu conhecida e desprovida. Apelação do autor conhecida e parcialmente provida. (TJDF; Rec 2011.07.1.004247-2; Ac. 758.224; Segunda Turma Cível; Rel. Desig. Des. J.J. Costa Carvalho; DJDFTE 13/02/2014; Pág. 84)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. RECEBIMENTO COM AGRAVO REGIMENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. CONDUTA OMISSIVA E CULPOSA DO ADVOGADO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO. DECISÃO MANTIDA.
1. Responsabilidade civil do advogado, diante de conduta omissiva e culposa, pela impetração de mandado de segurança fora do prazo e sem instrui-lo com os documentos necessários, frustrando a possibilidade da cliente, aprovada em concurso público, de ser nomeada ao cargo pretendido. Aplicação da teoria da “perda de uma chance”. 2. Valor da indenização por danos morais decorrentes da perda de uma chance que atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em vista os objetivos da reparação civil. Inviável o reexame em Recurso Especial. 3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, a que se nega provimento. (STJ; EDcl-REsp 1.321.606; Proc. 2011/0237328-0; MS; Quarta Turma; Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira; Julg. 23/04/2013; DJE 08/05/2013)
Por derradeiro, nas situações próximas as ora narradas, impõe-se a conclusão de que o advogado agira com culpa, pela negligência, quando assim trouxera prejuízos financeiros ao seu constituinte. Deverá, por isso, ser condenado a ressarcir os danos causados, se assim for pretendido pela parte lesada.
Dr.Alberto
Boa Noite
Como um passe de mágica, abro meu e.mail, e vejo este artigo.
Exatamente o que eu preciso, perdi um prazo em um Recurso Inominado, em violência doméstica, estou sendo massacrada pela cliente. processo criminal, civel e representação na OAB., mas quero dizer ao Sr. que não foi por desídia não, lutei até o fim, inclusive representei na Corregedoria contra o Cartório, por esta cliente, e nada, adiantou, vou pagar pelo meu erro, Lei de causa e efeito.
Novamente, muito obrigado.
Atenciosamente
Dail
Obrigado.
Alberto Bezerra
Muito bom o artigo.
Obrigado. Um abraço.
Ótimo o artigo..
Obrigado