Prova indiciária no Processo Civil Novo CPC

Artigo de doutrina sobre a prova indiciária no processo civil (novo cpc). Definição. Exemplos.
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PROVA INDICIÁRIA NO PROCESSO CIVIL

 

Frequentemente tenho redigido artigos voltados à técnica de atuação em audiência. E isso nomeadamente quanto aos embaraços que nessa acontecem. Pois bem, novamente cá estou com esse mesmo propósito.

O plano de fundo deste artigo é tomar conhecimento do que seja a “prova indiciária”. Porém, a partir da compreensão dessa, falarei quando e como esse tema se torna um entrave em audiência. Fato corriqueiro, até.

Antes de tudo, urge lembrar que prova é um componente que auxilia ao juiz aferir a existência e veracidade de determinado fato, o qual se encontra em questão nos autos. Assim, tudo que aconteça no transcorrer da contenda, e que tenha esse propósito, será considerado como prova.

As espécies de provas são classificadas se levando em conta o fato, o sujeito, o objeto e no que se refere à preparação. Sobretudo para não alongar-me nesta dissertação, restrinjo-me, aqui, quanto à prova do fato.

Relativo ao fato, a prova pode ser direta e indireta. Ambas dizem respeito ao fato probando, ou seja, àquele que tem consequência e valia ao destino da causa.

No que tange à prova direta, essa tem como foco o próprio fato questionado, a circunstância objeto de prova (fato probando), o episódio, como dito, de importância e diretamente ligado ao resultado da contenda.

Suponhamos que a objeção probatória diga respeito à ocorrência de um atropelamento, esse ocorrido na cidade de Porto Seguro, na Rua das Quantas, no dia 06 de março de 2016. Se, em audiência, propõe-se pergunta ao réu questionando-o se ele praticara esse ato, estamos, nesse caso, buscando provar diretamente o próprio fato controvertido: atropelou ou não atropelou a vítima. Esse é o acontecimento principal; a circunstância que, se provada, terá significativa pertinência à convicção do magistrado.

Lado outro, a prova indireta parte da ocorrência e comprovação de um outro fato que, por raciocínio dedutivo, chega-se à conclusão do fato principal, àquele controverso.

O exemplo para melhor compreender-se.

Em um outro artigo que aqui escrevi, utilizei-me de uma situação hipotética que bem se encaixa neste artigo. Naquela ocasião, situei uma imaginada demanda de Direito de Família, de disputa de guarda de filho decorrente de alienação parental. No depoimento pessoal do réu, pai da criança, o patrono da mãe, autora na ação, esquiva-se de fazer perguntas diretamente ligadas ao fato controverso: a desqualificação da mãe ao filho (alienação parental). Contudo, faz questionamentos indiretos que, somados a outros já colhidos, fariam o magistrado deduzir que, em verdade, ele perpetrara o fato em liça.

Um outro exemplo poderia ser o batom no colarinho da roupa do marido, alvo de querela judicial por traição. A marca de pneu, em decorrência da frenagem abrupta, para comprovar-se a ocorrência do episódio. O resíduo de pólvora na mão do investigado de homicídio, e por aí vai.

Define-se prova indiciária como sendo aquela na qual o magistrado se utiliza de indícios, para chegar-se ao fato probando. 

Nesse compasso, o magistrado nortear-se-á por indícios, pressupostos, por meio de ilações de que o fato probando ocorrera. Daí chamar-se de indiciária (prova). Assim, a mesma se identifica mais como um modo de raciocínio do que um meio de prova propriamente dito. Por esse ângulo, vê-se que impera a dedução, a inferência fundada em um fato conhecido (já provado, indiscutível). Esse — o fato sabido, demonstrado, verdadeiro –, servirá de apoio para alcançar-se o fato pretendido como prova (fato controverso, probando). O evento conhecido (indício) insinua o fato obscuro (perseguido como prova). Há um elo entre ambos.

De certa forma aparenta um jogo de quebra cabeças. As “peças são encaixadas no tabuleiro” pelo juiz, peças essas que significam indícios que o mesmo tomará por referência no julgamento.

Fácil notar que o indício, por si só, não tem qualquer efeito ao reconhecimento de um direito em questão. É inarredável, desse modo, que o indício necessita ser provado. Empós disso, é que se abre ao magistrado a possibilidade de utilizar-se da presunção judicial da ocorrência do fato probando. Por esse motivo igualmente conhecida como prova circunstancial, relativa à circunstância. É dizer, atinente a certas particularidades de tempo, lugar ou modo que acompanham um fato, uma situação etc.

Dado isso é que podemos extrair da etimologia da palavra indício: do latim, indicium, referindo-se a sinal, indicação, revelação, denúncia, descoberta, indício ou prova.

A Legislação Adjetiva Penal, por seu artigo 239, traz em si uma compreensão legal de indício, verbo ad verbum: “Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.”

De igual modo se pode concluir-se da Lei Substantiva Civil, in verbis:

Art. 212 – Salvo o negócio a que se impõe forma especial, o fato jurídico pode ser provado mediante:
(…)
IV – presunção;
omisses.

Outrossim, esses aspectos — as deduções, pressupostos ou indícios —, são de extrema importância sobremaneira nas demandas peculiares à agiotagem.

É consabido que a agiotagem é uma prática nefasta que acompanha as transações negociais do homem há muito tempo. Tal odiosa atitude costuma desenvolver-se na calada da noite, sem contatos e visitas, sem a presença de testemunhas. Ninguém se denomina à sociedade como agiota, máxime quando esse seja seu único meio de subsistência. Os indícios, pois, aqui, são valiosos.

Não foi à toa que surgira a seguinte disposição legal:

MEDIDA PROVISÓRIA No 2.172-32, DE 23 DE AGOSTO DE 2001.

Estabelece a nulidade das disposições contratuais que menciona e inverte, nas hipóteses que prevê, o ônus da prova nas ações intentadas para sua declaração.

Art. 1o São nulas de pleno direito as estipulações usurárias, assim consideradas as que estabeleçam:

I – nos contratos civis de mútuo, taxas de juros superiores às legalmente permitidas, caso em que deverá o juiz, se requerido, ajustá-las à medida legal ou, na hipótese de já terem sido cumpridas, ordenar a restituição, em dobro, da quantia paga em excesso, com juros legais a contar da data do pagamento indevido;

II – nos negócios jurídicos não disciplinados pelas legislações comercial e de defesa do consumidor, lucros ou vantagens patrimoniais excessivos, estipulados em situação de vulnerabilidade da parte, caso em que deverá o juiz, se requerido, restabelecer o equilíbrio da relação contratual, ajustando-os ao valor corrente, ou, na hipótese de cumprimento da obrigação, ordenar a restituição, em dobro, da quantia recebida em excesso, com juros legais a contar da data do pagamento indevido.

Art. 3o Nas ações que visem à declaração de nulidade de estipulações com amparo no disposto nesta Medida Provisória, incumbirá ao credor ou beneficiário do negócio o ônus de provar a regularidade jurídica das correspondentes obrigações, sempre que demonstrada pelo prejudicado, ou pelas circunstâncias do caso, a verossimilhança da alegação.

Por conseguinte, vê-se que a norma, quando enfoca o ônus da prova, reserva a hipótese da sua inversão. Porém, para que isso ocorra, necessário, ao menos, que fique evidente algum indício (tanto é que revela seja demonstrada, pelo prejudicado, ou pelas circunstâncias do caso, a verossimilhança da alegação).

Não por menos existem numerosos julgados que, seguindo essa ordem legal, não acolhem a tese de agiotagem, ad litteram:

NEGÓCIO JURÍDICO. ALEGAÇÃO DE SIMULAÇÃO PARA DISFARÇAR AGIOTAGEM. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. NECESSIDADE DE VEROSSIMILHANÇA NA ALEGAÇÃO E INDÍCIOS DE SUA OCORRÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO.
Para que se justifique a inversão do ônus da prova relacionada à alegação de agiotagem é indispensável verossimilhança nas alegações da parte, não bastando a isso a simples afirmação de sua ocorrência. (TJSP; APL 1006067-09.2015.8.26.0011; Ac. 9469802; São Paulo; Décima Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Ronnie Herbert Barros Soares; Julg. 30/05/2016; DJESP 15/06/2016)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS. INDÍCIOS DE PRÁTICA DE AGIOTAGEM. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. POSSIBILIDADE.
O c. STJ firmou o entendimento no sentido de que “havendo indícios suficientes da prática de agiotagem, nos termos da Medida Provisória n. 2.172-32, é possível a inversão do ônus da prova, imputando-se, assim, ao credor, a responsabilidade pela comprovação da regularidade jurídica da cobrança”. (RESP 1132741/MG). (TJMG; AI 1.0261.13.010447-2/001; Rel. Des. Roberto Vasconcellos; Julg. 08/03/2016; DJEMG 14/03/2016)

Bom, agora chegamos ao ponto nodal das minhas considerações. Irei dirigir-me às dificuldades tidas em audiência, precisamente quando o patrono almeja direcionar-se à produção de prova indiciária.

Não raro, muito pelo contrário, a regra, o comum, magistrados indeferem, equivocadamente, perguntas que não digam respeito diretamente ao fato controverso. O advogado da parte adversa, da mesma sorte, questiona “aonde o colega está querendo chegar com estas perguntas?” Como se não fizessem o mínimo sentido para esclarecer-se a verdade.

A questão, dessarte, é simples de identificar. Como se tratam de provas indiciárias, as perguntas, evidentemente, tentam atingir fatos alheios aos controversos. Com isso, aproximar-se da veracidade dos acontecimentos questionados.

Aparentemente vai de encontro ao núcleo do caput art. 459 do novo Código de Processo Civil, pois essa reza que:

Art. 459. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, começando pela que a arrolou, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com as questões de fato objeto da atividade probatória ou importarem repetição de outra já respondida.

Eis o problema. Digo problema máxime em relação aos colegas recém formados. Novato na profissão e ainda por cima abrir, possivelmente, acalorada disputa em audiência acerca da pertinência da pergunta, não é fácil, reconheçamos.

Vou mais além. Terá que “driblar” esse contexto, com a tarefa árdua de não tornar óbvia sua estratégia jurídica (frise-se). Afinal de contas, se o mesmo exprimir-se que “estou tentando colher provas indiretas para tornar inconteste esse fato discutido” é o mesmo que jogar fora essa prova. A partir de então, lógico, a parte e o advogado dessa estarão atentos às perguntas e, talvez, as seguintes respostas sejam capciosas.

Bom, apresentar o problema e não trazer a solução é fácil, não é mesmo? Então vamos lá. Vou lançar meu ponto de vista de como minimizar esse estrago.

É imprescindível que o colega faça constar em ata as perguntas que teriam de ser feitas (Novo CPC, art. 459, § 3). Ademais, a norma é clara ao exigir que a parte requeira a transcrição da pergunta. Não é ato de ofício do magistrado.

Ulteriormente, com as razões ou contrarrazões à apelação, o colega poderá alegar, em sede de preliminar, a nulidade do ato processual, em conta do cerceamento de defesa. (Novo CPC, art. 1.009,§ 1)

Espero que a dica lhe seja proveitosa.

Até a próxima…

Alberto Bezerra

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